Um homem desiludido com a vida e atirado num abismo de solidão decide se retirar do mundo, enclausurando-se num pequeno apartamento, de onde passa os dias observando dois vizinhos do prédio da frente - um estudante com insônia e um brutamontes que gasta seu tempo livre andando de um lado para o outro do apartamento. Este é o ponto de partida de O livro dos homens sem luz, obra de estréia do português João Tordo, que reúne personagens que, por razões diversas, decidem deixar de ser visíveis e mergulham, ora nas sombras de uma Londres gótica, ora no lado mais escuro de uma Brighton. Dividido em quatro novelas que se cruzam, se espelham, se complementam e se explicam, O livro dos homens sem luz tem um espectro amplo de narradores e de espaço temporal. A ação se passa numa Londres mais próxima da atual, bem como numa outra, distante mais de 60 anos, quando os aviões alemães faziam chover bombas sobre a cidade durante a Segunda Guerra Mundial. O grande engenho de João Tordo é fazer com que o homem que, inicialmente, observa os vizinhos por pura curiosidade, passe a fazê-lo profissionalmente e, adquirido o hábito de fazer relatórios, acabe por criar uma vida para seus observados. João Tordo conduz o leitor, através de um labirinto temporal, da Londres moderna até as entranhas de um abrigo subterrâneo, no qual duas pessoas, enclausuradas sob os escombros deixados por um bombardeio, tentam manter a vida e a sanidade. De Londres, a ação pula para um hospital em Brighton, que esconde uma quase medieval sala de torturas. Cabe ao leitor reconhecer a repetição de personagens e situações para completar as lacunas e fazer com que as quatro novelas aparentemente desconexas dêem forma ao romance.