Em O Maquinário Fantasma, primeiro livro de Guilherme Pavarin, nos deparamos com uma constelação de vozes que povoam a imaginação do poeta; vozes que surgem da memória e da história, mas também de objetos descartados, de um maquinário obsoleto que cisma em existir mesmo depois de perder suas funções originais. Fantasmas do novo milênio: uma máquina Brastemp transformada em aquário; ou um drone que insiste em participar com seu irritante zunido de uma performance teatral. Nesta terra devastada que herdamos, essas vozes fantasmagóricas nos interpelam, cobram dívidas do passado. São dívidas que nem mesmo sabíamos possuir, mas que, ao mesmo tempo, em um tempo sem futuro, são tudo o que temos; são o elo que nos prende ao aqui, o motivo para continuarmos nossa caminhada. É nesse cenário que o jovem poeta tenta se encontrar; que ele procura, entre tantas possíveis, a sua voz, uma tarefa ingrata entre os estímulos, horrores e carências com os quais o poeta é confrontado num país em escombros; em um planeta em crise constante onde só se pode “existir numa queda constante”, como diz o poema. Em um dos melhores poemas do livro, o poeta reflete sobre um cartaz destes que vemos em postes pela cidade, cartazes sobre um cachorro perdido, e sonha em aplacar a dor desses outros desconhecidos com um telefonema, mas logo descobre com sua amarga ironia que é ele quem precisa ser encontrado. Mas alguém o está buscando? Surpreendentemente, neste cenário impossível, Pavarin ainda encontra algum otimismo, um otimismo melancólico de quem não está disposto a abandonar essas vozes, um otimismo lírico que nos é familiar e acompanha aqueles que não se encaixam; que seguem gauches por aí, carregando os seus (os nossos) fantasmas. Uma estreia peculiar de um poeta disposto a mergulhar na investigação de temas diversos, a explorar a própria melancolia e o desafio de encontrar a sua voz.