Em O menino perfeito, Bernat Cormand nos faz conhecer Daniel, ao longo de um dia, por meio de desenhos extremamente delicados e um texto que seria simples não fosse o peso que as imagens lhe encerram. Com o lápis de cor e uma palheta que não por acaso torna quase tudo da mesma cor, Bernat revela, quase em sussurros, quem é Daniel, o menino perfeito: aluno aplicado, filho dedicado, que obedece aos desejos e expectativas de todos. Mas, o menino impecável, no entanto, carrega no rosto sempre a mesma expressão, que pouco nos diz e traz uma sensação de tristeza. Até que em uma determinada página, nos olha e sorri. Daniel sorri porque guarda um segredo: à noite, quando todos dormem, algo acontece. Uma leitura construída na costura perfeita entre um texto sensível, ilustrações, em cores que, mais do que suaves, são brandas, e, talvez acima de tudo, de silêncios, criando espaços para que o leitor se coloque, reflita e, principalmente, sinta. Segundo Ana Garralón, especialista em literatura infanto-juvenil, este é um daqueles livros que podem ser chamados de “perturbadores”. Ela conta que, na Espanha, quando de sua publicação, O menino perfeito foi, de certa forma, censurado por sua própria editora, tendo sido colocado em uma coleção para adultos. Para justificar-se, escreveram uma nota no blog: “Uma história com uma surpresa, que pode se dirigir tanto ao público adulto como ao infantil, ainda que a intenção do autor seja que seus leitores ou interlocutores sejam adultos. É por essa razão que incluímos o livro em nossa coleção Cabeça borrada, dedicada aos livros-álbum para adultos”. Ana, ironiza: “Ah, o que as crianças não devem ler”. E continua, mais pungente: “...do que pode servir aos adultos ler uma história lindamente ilustrada a não ser para sentirem-se, talvez, identificados com um momento de suas vidas já distante? Sem dúvida, a leitura entre os pequenos será como uma bofetada na cara. Alguns dirão: ‘e o que é isso?’, enquanto outros se identificarão e, portanto, se sentirão mais acompanhados em seu drama pessoal. (...)