Uma ação do tipo sujeito-arquiautor buscaria reavivar o espaço público minguado por interesses que apontam para a multiplicação de espaços privados, que preterem práticas cidadãs e politizadoras àquelas grafadas pelo consumo descompromissado de questões sociais, desde o uso e a ocupação democráticos dos espaços urbanos até a desobstrução de vias de mobilidade social numa sociedade marcada por enormes distâncias. Ou não é nada disso e a ação resume-se a beijar alguém numa ponte de tábuas à beira de uma lagoa urbana, causando despercebidamente inveja/inspiração nos que passam apressados por falta de amor, por medo de assalto, mas já rasurados pela possibilidade de o amor tomá-los de assalto naquela mesma ponte.Nos termos deste livro, não se especifica uma hierarquia entre prática do tipo sujeito-arquiautor e outra prática menor que nem se inscreva como sujeito-arquiautor nem como indústria cultural. A invenção do jogo aqui proposto, a premissa, o movimento das peças, especifica essa impossibilidade, ainda que não dita de forma explícita ao longo do texto. O outro da prática arquiautoral (ela própria definida como alegoria benjaminiana, espécie de avatar que já faz deslizar o ser/estar positivo e firmado no mundo) não poderia ser ninguém além da prática que descreve o movimento discursivo caracterizado como indústria cultural, aí sim uma metafísica, um a priori passível de uma crítica desconstrutivista que acusa a dicotomia assumida no esquema do jogo.Como dito, porém, não há hierarquia, separação, entre a prática do sujeito-arquiautor e outra de menor importância. É disso principalmente que o texto se previne e se blinda na proposição formal do “pequeno gesto”, especificado como postura cotidiana que politiza uso e ocupação do espaço público. Para o sujeito-arquiautor não há prática autoral e artística, arte, no sentido clássico do termo, mas sim num sentido rasurado, a princípio produzido por nós quando não pasmamos “no trono de um apartamento com a boca escancarada cheia de dentes esperando a morte chegar” (já dizia Raul Seixas, este sim um autor clássico). Essa dicotomização de práticas (pequeno gesto em contraste com deixar-se siderar no trono do apartamento em frente à televisão) pode ser alvo de crítica desconstrutivista. Mas aí, por outro lado, o livro se desfaria – haja vista que essa é a pulsão que o justifica como força no mundo, força bruta que brutaliza o jogo, sem vergonha de si.