A circulação de uma doença nas proporções planetárias, ao romper o cotidiano, modificando a ordem das coisas, tem um efeito incontrolável no contexto político e precisa ser encarada como um acontecimento que, se por um lado nos bloqueia, por outro, acelera processos sociais em curso. Isso pode tanto fortalecer um por vir de uma potência coletiva em uma solidariedade transversal ou mesmo aprofundar irrestritamente os meios e os modos de dominação capitalista. Uma transformação não é dada pelas reações imediatas, mas poderá ocorrer no confronto de perspectivas políticas, sanitárias, econômicas e sociais em movimento durante e, principalmente, pós-crise. Já nos é significativo como os diversos sentimentos e precipitações provocados pela pandemia nos afeta cotidianamente. Com isso, seremos capazes de ampliar dimensões de solidariedade, ainda que em um "ambiente" insalubre de encontro e ideias revolucionárias? No livro, o trabalhador da saúde e cientista político Paulo Spina, em uma escrita literária-política de um manifesto programático, defende que o lado daqueles que lutam por justiça precisam ir para ofensiva, propondo batalhas que disputem outras formas de organização da sociedade. O desafio é atravessar os limites lineares do curto prazo e da territorialidade nacional, e repensar com isso a própria política, agora encarnada em um projeto real, com sua multiplicidade dinâmica. Arriscar compreender este momento como oportunidade política para uma transformação efetiva além dos polos – estados nacionais versus mercado global – nos quais o modus de realizar a política social atualmente se vincula. A preocupação no texto é delinear um caminho de potência política que encontre formulações e proposições que nos atravessam por diversos espaços e tempos do ordenamento da sociedade, sem, contudo, hierarquizá-los de forma funcionalista, com uma dimensão na qual os poderes negam a si mesmos, sem reproduzir da lógica atual, realizando-se por meio de disputas efetivas, resistências programáticas e coalizões inesperadas. Construir novos horizontes globais, nacionais, domésticos e, principalmente, comunitários, como quatro ofensivas que coexistem e pluralizam as experiências e práticas políticas de formas interligadas, desconstruindo o pensamento e as maneiras comuns de ação e ocupação humana, sem uma ordenação que envolva a necessidade de mudanças subjetivas profundas, este é o projeto de materialização da imaginação gestada neste livro.