Um livro de contos que se lê como fosse um romance. A coesão das histórias deste Olho de Fechadura estrutura-se na escolha de temas e no delineio de personagens que ressurgem em situações diferentes como habitassem um microcosmo, espécie de cadinho onde tudo se amalgama ou se sedimenta para se completar. A opção por um recorte num tempo passado não doura a realidade mas pulsa na memória. As se circunscrevem a uma espécie de enclave territorial em que se situa a utópica Conceição dos Mansos, cenário maleável que se adapta às necessidade das tramas. Tempo e lugar específicos são elementos que fortalecem o nó virtual que ata os enredos num invólucro palpitante de vida. Atribui-se a Liev Tolstói a afirmação de que, ao cantar a própria aldeia um autor alcança a universalidade. Tenha ou não afirmado isso, ao eleger um cenário de uma pequena cidade paulista e a gente que a habita, e destemidamente debruçar-se sobre a gama dramática dos sentimentos e das relações humanas nas diversas etapas da vida, o autor destes contos reafirma a premissa tolstoiana. Deitando a cidade num divã hipotético, nada fica escamoteado e o que nem sempre é perceptível, transborda numa incisiva busca das motivações provindas da energia vital dos personagens. Sendo o inconsciente atemporal e não restrito aos limites da geografia, o mundo retratado neste Olho de Fechadura traduz as dissensões ou as mazelas que basicamente não se modificam através do tempo e do espaço físico e seguem inquietando o homem. Na atmosfera desse mundo particular pairam as influências da imigração italiana, a brava gente ( conforme Zuleika M. F. Alvim em seu livro sobre o assunto) enfrentando as dificuldades naturais da adaptação e empenhados em livrar-se dos grilhões iniciais da aventura de deixar a pátria de origem, dispostos e abertos ao entrosamento com o povo a que acabou se mesclando. São histórias que revelam uma inconteste maturidade autoral. O domínio da técnica do conto, a originalidade da linguagem, a fina perscrutação das instâncias emotivas que resultam em enredos verossímeis reafirmam as qualidades de um autor de obra respeitável – este é seu sétimo livro – e garantem o prazer da leitura.