As crônicas de Carlos Herculano Lopes nascem dos pequenos acontecimentos do cotidiano - de uma conversa na rodoviária, de uma agenda perdida em uma gaveta, de uma discussão na feira - e, num desenlace, na habilidade do autor, ganham uma dimensão poética, sempre acompanhada de uma melancolia e humor fino. O autor é um contador de histórias, que enreda o leitor com um fio de largura ínfima, mas resistente, e o guia para onde quer. Contando o que, à primeira vista, parecem ser histórias comuns, Herculano nos apresenta heróis improváveis - e que nem ao menos se imaginam heróis - e, quando menos esperamos, mostra, como se não fizesse força, um sentimento escondido, uma beleza perdida pela crueza do cotidiano e a rapidez dos dias cada vez mais corridos. Neste 'A ostra e o bode' estão reunidas cinqüenta crônicas publicadas em O Estado de Minas entre 2002 e 2005. São perspicácias de observação do autor, como em "No meio da noite", em que após um ônibus quebrar na estrada os passageiros conversam e trocam confidências para passar o tempo. Tudo estava ali antes, mas foi preciso a fagulha do tédio para as histórias aflorarem, e o olhar sensível do escritor para perceber a mudança do silêncio para as confissões e, depois do ônibus consertado, novamente o silêncio. A realidade também pode puxar um fio de memória, como na crônica "Por onde andará o palhaço Biribita?", em que a visão de um quadro com motivos circenses faz o autor recordar de um palhaço que povoava os sonhos das crianças emsua cidade natal, Coluna. A própria cidade do autor e a Belo Horizonte em que ele vive desde os 11 anos também aparecem em quase todas as crônicas. A urbe e seus microcosmos; o bairro, as ruas, a vizinhança, muitas vezes são mais do que um pano de fundo das histórias, mas personagem principal.