Konstantinos Kaváfis, nascido e falecido em Alexandria, no Egito, (1863-1933) é um dos mais fascinantes, mas também um dos mais desconcertantes poetas da poesia grega moderna. Esse homem solitário, que, nas palavras de Kazantzákis, realizou "a proeza da arte, orgulhosa e silenciosamente, e submeteu a curiosidade, a ambição e a sensualidade ao ritmo severo de uma ascese epicuréia", deixou uma obra rara, minuciosa e quantitativamente pequena: apenas 154 poemas breves. Mas, no escrever esses poemas e retocá-los obstinadamente até a forma com que desejou que se tornassem conhecidos do mundo, criou uma das obras poéticas mais originais do século XX. De fato, alguns de seus poemas parecem pertencer ao domínio da alquimia, uma vez que na sua elaboração ele utiliza, simultânea e indistintamente, tanto citações de poetas ou filósofos antigos, fragmentos de inscrições funerárias, crônicas helenísticas ou bizantinas, quanto notações ou expressões tomadas de empréstimo da língua cotidiana, transformando em poesia ingredientes fundamentalmente não-poéticos, de origem prosaica. Na verdade, Kaváfis encontra-se na fronteira em que a poesia se despoja e confina com a prosa. Temível fronteira que separa e ao mesmo tempo une a prosa e a poesia, tão impalpável e tênue em sua obra quanto um fio estendido entre dois abismos, no qual o tradutor deve se arriscar à maneira de um equilibrista! É isso que torna tão difícil, em todo caso, tão aleatória, qualquer tradução de Kaváfis: o equilíbrio a ser mantido entre as notações, enunciados, citações ou fragmentos prosaicos que entremeiam seus poemas e o próprio poema, constituído muitas vezes de materiais não-poéticos, como acuradamente notou Lacarrière.