'O Processo' nasceu num período importante da vida de Kafka. Entre 1914 e 1915, o contato com o hebraísmo oriental, a ruptura na relação com Felice Bauer e a opção pela solidão da escrita, sua única arma contra o mundo estabelecido. Nascido claramentede motivações autobiográficas, o romance as transcende, toca problemáticas universais, torna-se uma metáfora do destino do homem. A angústia da transgressão à ordem, familiar e social, e a consciência da vacuidade opressiva desta mesma ordem são a gênese da obra. Talvez por isso a leitura de 'O processo' não seja fácil. É sofrida, é uma leitura que se faz com ânsia, na qual estamos sempre à espera da resolução de uma história cujo percurso é inelutável, e do qual nos escapa o sentido. No processo kafkiano, é limitada qualquer possibilidade de avanço. Ninguém nos impede, ninguém nos obriga, mas nos sentimos absorvidos pelo labirinto asfixiante e claustrofóbico. O seu processo é um auto-processo interior celebrado segundo as normas de uma incompreensível lei inspirada na religião e na sociedade (e é um processo interior sobretudo porque a vida exterior de Josef K. poderia não mudar fora do estado de detenção). Por isso assume as proporções distorcidas de uma alucinação, de uma obsessão.