Único livro de contos de Augusto Abelaira, Quatro Paredes Nuas, de 1972, ilustra de forma exemplar a reiterada afirmação de Abelaira segundo a qual um autor escreve sempre o mesmo romance. As sete narrativas aqui reunidas, à partida excluídas desta afirmação por não se incluírem no género romance, fazem, no entanto, eco dos seus livros anteriores não só pela repetição do nome de personagens (Ana Isa ou Maria dos Remédios, por exemplo) e de alguns motivos (o barco Maria Brenda ou o diário), como por terem com eles uma clara afinidade temática e de estilo de escrita. A questão do género do livro é, aliás, lançada pelo autor na Advertência final, espécie de posfácio ficcional: são contos o que acabámos de ler ou há uma efectiva ligação entre eles e o que lemos são capítulos de um romance? A disjunção dos textos parece, de facto, mais aparente e formal, sendo possível reconhecer-lhes uma unidade, mostrada, desde logo, pela sua estrutura de diálogo, em que a natureza das relações amorosas, o papel do sujeito no mundo, a memória, o efeito do tempo e do acaso ou a indefinição entre real e imaginado são sucessivamente interrogados. O carrossel onde se encontram as personagens de Quem Me Dera Morrer , sempre em movimento e sem sair do mesmo sítio, num constante recomeço sempre igual, mas sempre diferente, ou as repetições que vão surgindo ( Uma flor? Um sol? Um pássaro? , as camisolas verde, azul ou branca) em Instantâneo ilustram não só a relação deste livro com os romances anteriores de Abelaira, como a própria vida, sobre a qual se reflecte, e a escrita que a repete.