Razões, Paixões, Utopias: Democracia em Questão. O tema deste livro surgiu de uma inquietação presente e uma perplexidade intuída e racionalizada sobre quão distantes estamos ainda de realizar as promessas democráticas. Por 'promessas democráticas' entendo aquelas promessas que se tornaram condição necessária para pensar a nossa condição presente, a partir do legado revolucionário francês da 'igualdade, liberdade e fraternidade'. Essas, que estão na base da construção política contemporânea, seja por um viés mais republicano ou liberal, se transmutam na proliferação de contradições teóricas e existenciais que não podem continuar sendo ignoradas. A igualdade prometida se depara com a exacerbamento das desigualdades sociais, políticas e econômicas; o ideal de liberdade se confronta por sua vez com refinamento de técnicas de exploração e dominação, não só na esfera do 'trabalho' como também se estendendo a todas as outras – digo 'refinamento' pois a manutenção de uma lógica opressiva depende da transmutação do próprio conceito de liberdade em que 'ser livre' passa a significar 'poder dominar o próximo'. Por fim, o ideal de fraternidade, que em si mesmo revela o paradoxo da exclusão de metade do gênero humano (as mulheres), transmutou-se em conceitos progressivamente tornados banais (normalizados) tais como o conceito de solidariedade social, mas desprovidos de conteúdo efetivo.
Este livro é composto por um conjunto de artigos que, individualmente, se debruçam sobre esta problemática, isto é, que colocam a democracia como problema. Quer a partir de uma perspectiva mais descritiva, quer de uma postura mais prescritiva, todos os artigos têm um propósito comum: todos se comprometem com a recuperação de condições para que essas promessas possam concretizar-se. A democracia como questão é o nosso ponto de partida. Caberá ao leitor fazer o seu próprio juízo sobre os seus limites e possibilidades atuais.