Dois meses depois da revolução portuguesa dos cravos (25 de abril de 1974) uma jovem nascida e criada no coração de Angola, passa como de costume suas últimas férias escolares no verão europeu. Foram três meses de prenúncio do rebuliço que sua vida seria dali em diante. Com o fim das férias e consequente retorno para a ainda colônia angolana, ela se vê vivendo e temendo por seu grande e primeiro amor, pelos seus amigos, pela sua confortável situação sócioeconômica, no epicentro do rodamoinho da guerra civil angolana. É um relato verídico, quase um diário das perdas, das dores, do medo, da angústia, da luta pela sobrevivência, do desespero e de todas as demais mazelas que as guerras invariavelmente injetam em todos os seus participantes, ativos ou passivos. Um ano depois de sua chegada ao Brasil, país para onde fugiu a menos de dois meses do dia da independência de Angola (11 de novembro de 1975), ninguém mais notava ser ela uma estrangeira. A perda do sotaque juntamente com a hibernação de toda a sua infância e adolescência, foi a maneira pragmática que inconscientemente usou para não ser questionada sobre sua origem e não mexer nas feridas que começavam a cicatrizar. Trinta anos depois o personagem por ela adotado para viver no novo país, que tão carinhosamente a recebeu dá sinais de esgotamento e como uma árvore sem raízes reclama por elas, para que possa continuar ereta. Essa reivindicação do seu âmago, juntamento com um velho pedido de seu marido e seus filhos para que escrevesse sua experiência de vida, desencadearam um processo de resgate das memórias olfativas, gustativas, sonoras, visuais, emocionais. A erupção desse enorme vulcão provoca uma profunda catarse e finalmente ela dialoga em paz com o seu pedaço por tantos anos amortecido.