Teoria da religião, de Georges Bataille (escrito em 1948, mas publicado postumamente), é um livro inclassificável. É ao mesmo tempo um livro de antropologia, de economia, de sociologia, de história da religião (no singular). A religião é compreendida aqui em um movimento geral que abrange a totalidade da história da vida social. O cristianismo – a religião moral, humanizada, capitalista, a “religião nos limites da razão” – é remetido a um plano etnográfico, que tem na vida animal, no que Bataille chama de intimidade ou imanência, o seu grau zero ou a sua ontologia. É nas “sociedades primitivas” que Bataille encontra o sagrado, que o surgimento do mundo do trabalho virá interromper, introduzindo uma separação no interior da intimidade animal. Esta só vislumbrada de novo na operação suntuária do potlatch, no sacrifício – do animal, do homem, do Deus.Como e por que ler este texto no século XXI no Brasil? A leitura que se fará dele hoje é substancialmente diferente da que foi feita pelos seus contemporâneos franceses, que ouviram a conferência “Esquema de uma história das religiões”, que serviu de base ao livro, também publicada neste volume. Teoria da religião permanece uma das tentativas mais profundas de pensar uma alternativa ao modelo econômico do mercado, do valor de troca, da produção. Há neste livro uma reflexão energética, uma referência provocadora aos animais, e às religiões totêmicas, e um lugar reservado ao islamismo extremamente atuais. Teoria da religião continua um livro profundamente enigmático. Leiamos ou releiamos Bataille.João Camillo Penna