O ímpeto de reprimir os crimes menores com o máximo de rigor produz a mágica de tornar as classes mais pobres e desamparadas, não apenas como preferenciais da vigilância - classes perigosas -, mas também como classes naturalmente criminosas. A violência, no âmbito das relações humanas, vem afligindo o mundo moderno e inevitavelmente o Brasil. O fenômeno é por isso mesmo objeto de um vasto exame nacional e internacional. Mas a diversidade das abordagens rearticula ideias que exigem uma análise multidisciplinar, cuidadosa e profunda, dos parâmetros e conceitos envolvidos. Aqui, o autor desvela, por detrás do discurso aparentemente modernizante de um individualismo reacionário, de uma culpabilidade individual e de postulados que reivindicam o estatuto da ciência, um modelo autoritário e não democrático no plano político, que deixa de lado os axiomas da democracia, da igualdade entre homens e da compreensão das relações sociais. De fato, ao papel já salientado por Celso Lafer a respeito da pobreza e do desemprego no processo de exclusão , superpõe-se não só o incremento da brutalidade policial, como continuam a persistir situações para tornar os homens supérfluos e sem lugar no mundo comum . Assim, a despeito do fim de alguns totalitarismos, constata Hannah Arendt, a sociedade moderna vê-se atacada por um mal insidioso e pertinaz que ameaça gravemente um de seus mais preciosos bens - o exercício da liberdade.