Setenta anos de caminhada exploratória pelo grande sertão das palavras, em suas veredas russas e portuguesas, encontram em Tradução, Ato Desmedido, de Boris Schnaiderman, uma espécie de traçado cartográfico anotado ao longo desse percurso. Mas o mirante, da Estrela Polar para o Cruzeiro do Sul, sempre foi, a quem fixasse seu olhar nas letrinhas miúdas dos signos linguísticos, um só: propiciar ao seu leitor um texto que, vindo dos campos ou das taigas boreais, fluísse interiormente no seu receptor, como se tivesse nascido nos meandros das falas tropicais, em que pese sua fidelidade às origens. Tarefa utópica? Sem dúvida, mas, não obstante, um modelo perseguido por um tradutor que, em sua incessante e hoje reconhecida faina, tem como bússola a crítica armada da melhor erudição da pesquisa moderna e, sobretudo, de uma autocrítica que não cede a nenhuma das tentações do ego e da vaidade literária, fruto que é de um ditame interno, temperado, no foro existencial de Dostoiévski, Tolstói, Tchékhov, Górki e Maiakóvski. Na sua singeleza e despretensão, os ensaios e artigos aqui reunidos compõem, por certo, malgré soi e talvez com os protestos do autor, uma lição não só de devotamento, honestidade, capacidade e talento, como de trabalho metódico e criativo - que serve quase como um guia de como se faz uma tradução de qualidade - na árdua tarefa a que se propôs: lermos os russos como lemos os brasileiros." J. Guinsburg