O fim da Guerra Fria não criou uma nova ordem mundial estável. Após o fim da competição entre o estatismo do Leste e as democracias de mercado do Ocidente, os conflitos militares, as guerras civis e o terrorismo internacional foram ampliados. Coube aos Estados Unidos, a última potência hegemônica, o esforço de impor a nova ordem através de guerras de emergência contra os excluídos do mercado mundial. Essas guerras de ordenamento estavam fadadas ao fracasso. Com o endividamento galopante, os cortes sociais e o desemprego estrutural, os gastos crescentes com a segurança militarizada podiam apenas multiplicar os perdedores da globalização. Já não era possível chamar os vilões da globalização capitalista de inimigos externos, pois eles próprios eram um produto da decomposição do mercado mundial. Se durante quase três décadas a posição dos EUA como polícia mundial parecia inabalável, o agravamento da crise de 2008, que atingiu o coração do sistema global, provocou uma erosão da sua hegemonia. O que se seguiu foi um acirramento das disputas de poder entre as grandes potências cada vez mais débeis, sob as condições de um capitalismo de crise global. Tomasz Konicz acompanha o conflito atual na Ucrânia desde a sua origem, em 2014, e demonstra como essa guerra cujos traços gerais ele antecipou de maneira notável conduz o mundo a uma nova ordem multipolar ainda mais frágil e caótica do que a anterior. Em vez do equilíbrio entre blocos de poder e uma nova paz entre potências regionais, essa nova ordem seria marcada pela externalização das contradições internas aos países que leva a uma escalada militar global. Os processos de desintegração econômica se transformam em tendências de fragmentação do poder estatal. A guerra no Leste Europeu mostra como essas tendências estão cada vez mais próximas dos centros do mercado mundial e aponta os limites da própria concepção de soberania, já que forças paramilitares de mercenários e de milícias neofascistas atuam abaixo, ao lado e para além dos diversos poderes estatais nacionais envolvidos no conflito. Diante dessa guerra difusa em que objetivos diversos se combinam, o risco de um conflito nuclear volta a pairar como uma uma sombra mortífera sobre o século XXI.