Um corpo à deriva é um romance distópico. A partir de um pacto doloroso entre dois jovens, Eu e Tesfa, a trama se desdobra em fragmentos. No decorrer de uma tarde, entre a entrega amorosa e os desencontros, os jovens recordam fatos de suas experiências atravessadas por fatos da história do Brasil. Confinados no pequeno apartamento, eles recebem a “visitas” do Velho angular (uma voz ancestral), do amigo Chagas (artista plástico) e de Fin (outra enigmática voz do passado). Através de uma teia de antinarrativas, os personagens desvelam a solidão e o horror como guias da vida contemporânea. Os versos de Derek Walcott (“Há uma luz nova vindo depois da tempestade/ no mar ainda em desordem ...”), encimados como epígrafe, antecipam o que é, para os personagens, conhecimento da história e desamparo ante as incertezas do futuro. Mas Um corpo à deriva é também um romance utópico. No discurso de Tesfa desponta um caminho de redenção para o Eu, o Chagas e o Fin. Ao denunciar a violência, a personagem recupera outra palavra, ainda não enunciada, por isso capaz de reinaugurar o mundo. A obra analisa temas como o autoaniquilamento, a solidão, a amizade, a história oficial e a própria linguagem como suporte de enunciação. Um corpo à deriva, embalado pelo pathos musical de várias vozes negras, dança à beira do abismo, arriscando-se como só é possível a quem vive.