Autobiografia da engenheira e bióloga Temple Grandin, que bem cedo foi diagnosticada como autista. Conversando com o neurologista Oliver Sacks, ela pronunciou uma frase que dá bem a medida de como o mundo lhe parece estranho: "A maior parte do tempo eu me sinto como um antropólogo em Marte".Até os três anos e meio, Temple só se comunicou por intermédio de gritos, assobios e murmúrios de boca fechada. Sua mãe percebeu que já aos seis meses ela não se aninhava no colo: ficava rígida, rejeitava o corpo que queria abraçá-la. Na escola, batia na cabeça das outras crianças. Em vez de argila ou massinha sintética, usava as próprias fezes para modelar e espalhava suas criações pelo quarto. Às vezes ignorava sons altíssimos, mas reagia com violência aos estalidos de uma folha de celofane. O cheiro de uma flor recém-colhida podia deixá-la descontrolada ou fazê-la refugiar-se em seu mundo interior. Somente quando já tinha quase trinta anos conseguiu dar um aperto de mão e olhar nos olhos de outra pessoa. Construiu uma "máquina de abraço" para pressioná-la sem o desconforto intenso que um outro corpo humano provoca nela.O grau de autismo de Temple Grandin não é o mais alto, e por isso o mundo que ela criou não se parece com uma fortaleza onde ninguém pode entrar.Temple se tornou uma profissional extremamente bem-sucedida. Projeta equipamentos e instalações para a pecuária. Todos os corredores e currais que desenha são redondos, pois o gado tem mais facilidade em seguir um caminho curvo - primeiro porque, não vendo o que há no fim do caminho, fica menos assustado; segundo porque o desenho curvo aproveita o comportamento natural do animal, que é descrever círculos. Ela faz uma analogia: com as crianças autistas é preciso agir do mesmo modo, isto é, trabalhando a favor delas, ajudando-as a descobrir e desenvolver seus talentos ocultos.De certa forma, esta autobiografia nos diz que as pessoas todas podem se tornar menos "estranhas".