Este livro focaliza de modo inovador os discursos de dois atores centrais no processo de construção do problema social das "drogas": a medicina e a mídia. Discutindo com cuidado e inteligência as formas e circunstâncias em que se expressam publicamente os saberes autorizados da medicina, Maurício Fiore expõe a diversidade dos posicionamentos de profissionais ligados a algumas das mais importantes instituições médicas e acadêmicas brasileiras que lidam com "drogas'. Ao mesmo tempo, realça as dificuldades para se estabelecer distinções nítidas entre os pontos de vista dos médicos no debate público sobre esse tema tão candente e ainda mal explorado pelas ciências sociais. A análise dos sentidos e usos da própria noção de "droga" mostra como as categorias médicas e as do senso comum refletem-se e reforçam-se mutuamente, com implicações que ultrapassam o mero esforço dos especialistas de se comunicar de maneira acessível ao grande público. Os médicos discorrem com desenvoltura sobre legislação e constroem argumentos que apelam a questões de responsabilidades e direitos, segundo o pressuposto de que o uso de "drogas" é, em si mesmo, indesejável e perigoso. Na raiz da dificuldade de exprimir qualquer sentido positivo sobre as "drogas", como bem mostra o autor, reencontramos a ênfase médica na preservação da vida como valor moral a qualquer custo, revigorada pela obsessão contemporânea com o controle de riscos, que desautoriza qualquer precedência à inten-sidade, ao prazer e ao êxtase.