Em fevereiro de 1965, sobre o palco do show Opinião, ganhava espaço no cenário artístico nacional Maria Bethânia Telles Vianna Veloso. O espetáculo, produzido pelo Teatro de Arena e dirigido por Augusto Boal, tivera sua estreia em dezembro do ano anterior, com um elenco formado por João do Vale, Zé Keti e Nara Leão, depois substituída por Bethânia. Até então desconhecida no eixo Rio/São Paulo, a artista consagrou o ato inaugural de sua carreira aos 17 anos de idade com a interpretação de Carcará, naquela que viria a ser considerada a primeira manifestação de protesto após a instauração do regime militar no Brasil. A assinatura conferida a Carcará pela artista consagrou a sua própria assinatura “como artista”, por meio de uma performance que, revelando a instância semântica que o texto escrito oculta, ressignificou a canção. Consectário lógico da capacidade que possui a performance poética de grafar, por meio da voz, o registro de uma sintaxe expressiva contígua que extravasa os limites da escrita. O que a obra Vozes de Opinião apresenta é uma análise da cena poética de Maria Bethânia em Carcará, à luz dos elementos que compuseram a performance da artista naquele ano de 1965. Trata-se, pois, de uma recuperação dessa cena poética acobertada por uma releitura histórica, realizada à luz de pressupostos teóricos da Teoria da Literatura e da Filosofia da Expressão Vocal. Propõe-se, assim, uma imersão numa performance poética na qual, em substituição à pena da galhofa, prevalece a grafia do corpo sobre o palco, na elemental escritura de sua força motriz: a palavra cantada encarnada na tessitura vocal de Maria Bethânia, na cena poética de Carcará.